sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Passagem, 52


Aquele dia iria acordar e agir diferente, ser outro alguém que sequer fazia ideia quem. Andar ao revés, olhar para o céu descontroladamente, buscando panoramas diversos, quem sabe algum reflexo seu, de outras épocas, outras gerações, outros "eus"? Aquele dia ia pedir sossego, ia caminhar tranquilo no centro da cidade, atravessar na faixa de pedestres, respeitar o sinal, guarda-chuva fechado sob as marquises, sem esbarrar em ninguém, e se trombassem nele, iria sorrir e dizer "boa tarde". Aquele dia não pegaria ônibus lotado, nem iria dirigir, queria apenas andar e andar e andar, para limpar a alma, acariciar a mente, sanar todas as dúvidas e questionamentos que fazia, faria e fez nos últimos anos. Aquele dia iria tirar 5 minutos de seu tempo e tomar o café sem esfriar, enquanto pensava na vida e respirava tranquilo. Aquele dia não iria mexer no celular, olhar as atualizações frenéticas de redes (anti)sociais que só o mantinham preso e atrelado a um vazio ainda maior. Aquele dia queria ser diferente. Aquele dia queria ser mais leve, pensar mais leve, sorrir mais leve, se preocupar menos. Aquele dia queria ser um pouco menos "gente grande" e relembrar os ares da infância, das balas, dos brinquedos, dos sonhos tão tangíveis e prazerosos. Do gosto fantástico do pudim de leite condensado, do imenso prazer de faltar de aula e curtir as horas que custavam a passar enquanto assistia a um filme ou brincava com seus colegas, a sensação de proteção que os pais podiam passar e aquele conforto gostoso de, simplesmente, estar em casa. Aquele dia sonharia acordado.

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