terça-feira, 25 de novembro de 2014

Passagem, 37 - mar e ar


" Deix'esse mar desaguar '', era tudo que ele repetia pra si nos últimos dias. A água fazia uma limpeza em sua mente e deixava seu espírito mais leve. O redor era cinza e turvo, e apesar do sol, em alguns dias mal enxergava um palmo à sua frente. Sabia, sabia, sabia, e não sabia coisa alguma. O disco girava e não fazia ideia de onde iria parar, era um jogo de sorte, era preciso deixar-se levar pela correnteza. A água forte limparia os pés e o peito, aos trancos e barrancos dos destroços e das pedras, buzinadas e semáforos, tudo igual, tudo torto e misturado, tudo belo refletindo ao sol escaldante do asfalto salgado. Os pés ardendo, os olhos feridos, cabelo embolado, ar quente, ar seco, idas e vindas das águas, dos carros, dos ônibus e dos pedestres, sem pés, nem cabeça e nem olhos, sem olhos ao céu, ao mar, ao ar.

Deix'esse mar desaguar.

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